Por: Anna Francischini / edição: Júlia Beatriz Oliveira

Na cidade de Paragominas, no Pará, o produtor rural Mauro Lúcio trabalha há mais de 26 anos com pecuária sustentável, consequência da pecuária sobre princípios, como ele define. Nesta prosa do campo, o Nós do Mato conversou com o mineiro de Governador Valadares, proprietário da fazenda Marupiara, para entender sua visão sobre a legislação ambiental.

Paragominas, Pará

Paragominas, importante polo agropecuário no leste do Pará, vivenciou um intenso processo de exploração desde sua fundação em 1965, impulsionado pela exploração madeireira e pela expansão da agricultura e pecuária. 

Entretanto o crescimento desordenado desses setores levou o munícipio a altos índices de desmatamento ilegal, o colocando em destaque no ranking nacional. Como resposta, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) lançou em 2008 a operação “Arco de Fogo” para reverter essa situação crítica.

Por conseguinte, a necessidade de operações de combate a crimes ambientais surge em resposta às previsões científicas de extremos climáticos no futuro, causados por atividades relacionadas ao uso do solo, como o desmatamento. Hoje, mais de uma década depois, as consequências como chuvas extremas e longos períodos de estiagem já são uma realidade.

Pecuária Verde

Foi neste contexto que o pecuarista assumiu, em 2009, a presidência do Sindicato dos Produtores Rurais de Paragominas, responsável por liderar o projeto “Pecuária Verde”. A iniciativa se desenvolve baseada em quatro principais objetivos. São eles:

  • Aumento da rentabilidade das fazendas por meio do aumento da produtividade;
  • Melhoria do bem- estar dos animais, o que que afeta a produtividade do gado e a segurança e bem-estar dos funcionários;
  • Melhoria ambiental: planejamento do uso do solo baseado no potencial agropecuário e restauração de áreas desmatadas ilegalmente ou inaptas para agropecuária.
  • Capacitação e valorização dos trabalhadores. 

O projeto, iniciado em 2011, foi tão bem sucedido que Paragominas deixou de ser um dos centros do desmatamento do Brasil e se torna um caso de sucesso do crescimento agropecuário sustentável. 

Como resultado, uma análise do projeto feita em 2014 pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), revelou em números os resultados positivos do projeto para as fazendas envolvidas. 

De acordo com a publicação, as propriedades rurais conseguiram aumentar a produtividade em cerca de quatro vezes em comparação com as fazendas típicas. Foi um aumento de cinco para 20 arrobas de carcaça de peso vivo por hectare por ano. Consequentemente, as fazendas que aumentam a produtividade são mais lucrativas e apresentam maiores índices de satisfação dos trabalhadores em relação às condições de trabalho.

Questão de princípio

Uma das palavras que Mauro Lúcio mais enfatiza é “principio”, o que, segundo ele, gera reciprocidade. 

Quando você usa o princípio da reciprocidade, é o seguinte: você dá para a terra, a terra vai te devolver e ela te devolve muito. E aí a gente aumenta a produtividade, produz muito melhor. Ou seja, você consegue ter um negócio muito mais lucrativo. Não é pela regra, é pelo princípio de fazer bem feito e de tratar bem não só do ambiente, mas dos animais e das pessoas”, explica.

Rastreabilidade e oportunidade de negócio

Além do aumento da produtividade como consequência de práticas ambientalmente sustentáveis, outra vantagem é poder agregar valor ao produto. E aí entra o papel rastreabilidade.

A rastreabilidade animal é um processo que registra todo o histórico da carne que chega até o consumidor final. Isso vai desde o local onde o animal nasceu até a situação ambiental da fazenda onde foi criado. Para quem consome, a rastreabilidade é uma garantia de uma carne de boa qualidade e segura para alimentação. Para o produtor rural, o controle do rebanho, a otimização e planejamento estratégico da produção, além da valorização do produto diante do mercado, são apenas alguns dos benefícios.

Este último ponto é uma das oportunidades identificadas pelo produtor rural. 

Quem tem condições no planeta de vender boi ou vender carne com índice de biodiversidade mensurado? Só nós. Então isso é o princípio e aí eu vendo e agrego valor nisso. Nenhum dos produtores que vendem vinho caro [em regiões da Espanha, da França e da Itália], eles olham para a regra, ninguém vai cobrar, você não vê ninguém exigir nada.”

Mas de que regra ele fala?

No Brasil, uma das principais leis que incentivam o desenvolvimento sustentável é o Código Florestal. Aprovado um ano após o início da Pecuária Verde, em 2012, a legislação criou e adaptou instrumentos já existentes em suas versões anteriores. É o caso do Cadastro Ambiental Rural (CAR), as Reservas Legais (RL) e as Áreas de Preservação Permanente (APPs).

Florestas atrapalham a produtividade no campo?

Na pecuária, atividade de Mauro, estudos e experiências práticas mostram que sistemas intensivos, ou seja, sem necessidade de expansão de área produtiva, são mais produtivos do que os extensivos, que exigem o desmatamento.

Para Mauro Lúcio, que é um destes casos de sucesso, é necessário fazer um trabalho de base.

“Para pequenos produtores é essencial levar conhecimento e capacitação para usar tecnologias que aumentem a produtividade sem desmatar. Precisamos mudar a cultura do desmatamento para implantar práticas mais eficientes e sustentáveis” diz.

Já em relação aos projetos legislativos que trabalham com a proposta de diminuir a proteção ambiental no Brasil, como o projeto de lei (PL) nº 3334/2023, que diminui a área de reserva legal de imóveis rurais na Amazônia, o produtor rural comenta que são medidas que avançam no Congresso Nacional sob argumentos falaciosos. 

“Os políticos que falam que precisa abrir mais áreas para a produção e para gerar empregos estão dizendo uma falácia. O problema não é a falta de área aberta, e sim áreas produzindo melhor, com mais eficiência”.

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